Lei, que entrou em vigor no mês de setembro, vai mobilizar novas formas de tratar o uso de dados pessoais nos ofícios
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) vai causar mudanças no funcionamento dos ofícios, mas não é impeditiva quanto à manutenção da função natural dos serviços notariais e registrais: dar segurança jurídica aos atos e contribuir com a publicidade e o bom andamento econômico no meio em que está inserido. O impacto da LGPD nos ofícios foram analisados em painel IV da Conferência Nacional dos Cartórios (Concart 2020). Na oportunidade, Os debatedores analisaram que há espaço para que as entidades representativas do setor se unam para contribuir com aperfeiçoamento da nova legislação. O texto entrou em vigor a partir de setembro deste ano lançando uma série de critérios para a manuseio correto dos dados pessoais em empresas e órgãos públicos.
O advogado Bernardo Amorim Chezzi, um dos palestrantes, afirmou que os departamentos jurídicos e da tecnoloiga de informação terão cada vez mais que unir forças para identificar procedimentos de uso dos dados em respeito à nova lei. “Fará parte do dever de casa de todo mundo de organizar os fluxos e evitar riscos da informação. O provimento 74 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) traz requisitos mínimos de segurança da informação que deverão ser cumpridos pelos cartórios para a proteção destas informações”, afirmou Chezzi, que também é vice-presidente do IBRADIM (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário).
Fernanda Castro, tabeliã registradora em Minas Gerais e diretora geral da Ennor (Escola Nacional de Notários e Registradores), informou que as entidades representativas dos ofícios estão preparando uma cartilha que será publicada em breve para ajudar a esclarecer o emprego correto da LGPD. Por meio da Ennor, estão em andamento a formação de grupos de estudos para ajudar na confecção do conteúdo das cartilhas com a finalidade de trazer orientação aos cartórios.
Debate mundial sobre proteção de dados
Bernardo Chezzi lembrou que o debate sobre as melhores normas para aplicar leis de proteção de dados ocorrem em vários países. O especialista citou muitos exemplos no continente europeu. De acordo com o advogado, Holanda e Suécia entenderam que não se poderia restringir quem pede informações no registro público. Na Inglaterra, houve mudanças substanciais, de um ambiente com rigor nas restrições para flexibilização em determinados casos.
Na Espanha, a lei que regula a proteção e o uso correto de dados entende que o legítimo interesse é presumido. Assim, segundo Chezzi, cumpre-se a função do registro público, que é o fornecimento da certidão. “Não tivemos cerceamento no fornecimento, mas esse legitimo interesse de quem pede é presumido pelo interesse privado, do credor e do capital que move o acesso ao registro. A gente precisa estudar melhor os modelos regulatórios do exterior e encontrar o que se coadune melhor para nós”, destacou o advogado.
Entidades representativas devem se mobilizar
O advogado Dixmer Vallini Neto, que também palestrou no painel, sugeriu a necessidade estratégica de mobilização das entidades que representam os ofícios. O objetivo é ajudar na confecção das normativas que virão aos cartórios sobre como cumprir a lei de proteção de dados. De acordo com o especialista, não se deve aguardar a norma pronta, pois ela pode vir sem levar em conta a realidade do funcionamento cotidiano dos ofícios, que só os notários e registradores conhecem.
Vallini Neto chamou a atenção de que a LGPD garante a publicidade dos atos nos cartórios, desde que haja emprego específico das informações. “A LGPD não proíbe a publicidade dos dados, traz algumas regras. Inclusive no artigo sétimo diz que publicidade é importante, desde que feita dentro de certos limites e atendendo finalidade específica. A lei geral enaltece a publicidade para atingir aquele objetivo de segurança jurídica. Evidente que você não precisa constar na escritura, por exemplo, o e-mail e telefone da parte”, exemplificou.
Existem situações que vão precisar de novos estudos a respeito da LGPD, apontou Vallini Neto. Uma delas versa sobre qual órgão ou instituição a que os cartórios estarão subordinados em caso de aplicação de pena. A LGPD fala que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) é que terá essa tarefa, mas os cartórios também são acompanhados pelas corregedorias dos Tribunais de Justiça e do CNJ. “Estaríamos em um conflito regulamentador entre a LGPD e a competência das corregedorias em normatizar, fiscalizar e punir. A própria LGPD diz que a competência é exclusiva da ANPD”, ressaltou Vallini Neto.
Outro ponto que demanda esclarecimento, disse ele, é sobre o que envolve o critério de multas, já que o enquadramento dessa infração no âmbito da lei de dados é diferente para empresas do setor privado e a atividade dos ofícios, que são entes privados, mas de origem pública. Bernardo Chezzi, em resposta ao questionamento de Vallini Neto, afirma que na própria LGPD há espaço para que o CNJ possa atuar em conjunto com a ANPD. Fernando Castro destacou que um dos pontos iniciais de referência sobre multas e outros assuntos pertinentes a LGPD serão os provimentos emitidos pelas corregedorias.
Confira a transmissão completa, no Youtube da CNR Confederação.