“O que está em jogo é o futuro do trabalho no Brasil”, alerta Luiz Marinho sobre pejotização

Foto: Matheus Itacarambi / MTE

Ministro participou de audiência no STF e destacou os riscos da contratação por pessoas jurídicas à proteção social, ao FGTS e à Previdência.


O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, participou nesta segunda-feira (6) de audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília (DF), para debater os impactos da pejotização sobre os direitos trabalhistas e o sistema de proteção social no brasileiro.

Convocada pelo ministro Gilmar Mendes, a sessão reuniu representantes do governo, do Ministério Público, da advocacia pública, de entidades de trabalhadores e do empresariado, com o objetivo de reunir informações e subsídios para o julgamento de ações que questionam a constitucionalidade da contratação por meio de pessoa jurídica em atividades que apresentam características típicas de vínculo empregatício.

Durante a audiência, Luiz Marinho agradeceu ao ministro Gilmar Mendes pela abertura ao diálogo e pela disposição em ouvir diferentes setores antes da decisão da Corte. O ministro alertou ainda para os riscos de que a pejotização generalizada provoque o “desmonte” das estruturas de proteção social, como a Previdência Social, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e o Sistema S.

“O que estamos assistindo no mercado de trabalho é um processo devastador de desvalorização do trabalho. Se liberarmos geral, como ocorreu na terceirização, colocaremos em risco o que foi construído com sacrifício de trabalhadores, empregadores e do Estado ao longo de décadas”, afirmou.

O ministro destacou que, entre 2022 e 2025, a perda de arrecadação combinada da Previdência, do FGTS e do Sistema S ultrapassa R$106 bilhões, comprometendo políticas públicas essenciais em áreas como habitação, saneamento, qualificação profissional e previdência. “Estamos enfraquecendo as bases que sustentam o desenvolvimento nacional”, alertou.

Luiz Marinho também ressaltou que o Microempreendedor Individual (MEI) foi criado para proteger trabalhadores autônomos de baixa renda, e não para substituir vínculos formais de emprego. “O MEI nasceu para amparar quem vendia café, pipoca ou salgados nas ruas, e não para abrigar profissionais que deveriam estar sob a proteção da CLT”, explicou.

Segundo o ministro, muitas empresas têm pressionado trabalhadores a abrir CNPJs para exercer funções com subordinação e controle de jornada, descaracterizando o vínculo empregatício. “O que está em discussão não é a existência de pessoas jurídicas, mas a fraude trabalhista travestida de modernização”, afirmou.

Ele também refutou o argumento de que profissionais de alta qualificação — como médicos e engenheiros — poderiam ser considerados “hipersuficientes” e, por isso, dispensados da proteção da CLT. “Mesmo o trabalhador com formação superior não tem o mesmo poder de negociação frente a uma corporação. Isso é papo furado. Se há subordinação, é relação de trabalho e deve ser regida pela CLT”, concluiu.

Fiscalização revela precarização e perdas bilionárias

A auditora-fiscal do Trabalho, Lorena Guimarães Arruda, trouxe a perspectiva de quem acompanha diariamente as relações de trabalho em empresas, canteiros de obra e plataformas digitais. “A pejotização tem sido utilizada como forma de precarizar vínculos e fraudar direitos trabalhistas e previdenciários. Não é uma abstração teórica — é a realidade que constatamos em campo”, afirmou.

Dados da Auditoria Fiscal do Trabalho, com base no eSocial, mostram que, entre janeiro de 2022 e julho de 2025, cerca de 5,5 milhões de trabalhadores demitidos migraram para a condição de pessoa jurídica, sendo 4,4 milhões como microempreendedores individuais. Mais de 55% desses MEIs correspondem a ex-empregados que continuam exercendo as mesmas funções nas mesmas empresas, agora sem direitos trabalhistas.

Lorena relatou ainda um caso recente de um trabalhador contratado como pessoa jurídica que morreu após cair do décimo andar de um edifício em construção. “Não havia equipamentos de proteção nem responsável técnico. O tomador do serviço e a empresa terceirizada negaram qualquer responsabilidade. A família ficou sem amparo, sem seguro, sem FGTS, sem previdência — sem nada além da dor e da burocracia”, disse.

FGTS e políticas públicas em risco

Segundo estimativas da Auditoria Fiscal do Trabalho, entre 2022 e 2025 a pejotização provocou um déficit de R$ 70 bilhões na Previdência Social, R$ 8 bilhões no Sistema S e R$ 27 bilhões no FGTS — recursos que deixaram de ser investidos em moradia popular, infraestrutura e geração de empregos.

“O FGTS não é apenas uma conta individual do trabalhador. Ele é um instrumento coletivo de desenvolvimento social. Cada vínculo formal rompe o ciclo da precariedade e ajuda a financiar este país”, afirmou Lorena.

Ela alertou ainda que a expansão da pejotização enfraquece políticas de inclusão, como o programa de aprendizagem profissional e a inserção de pessoas com deficiência, ambos sustentados pela existência de vínculos formais de trabalho. 

Estado e Justiça do Trabalho

Durante a audiência, o advogado-geral da União, Jorge Messias, destacou que cabe ao Estado preservar a essência do contrato de trabalho e garantir o equilíbrio nas relações produtivas. “A modernização das formas de contratação não pode significar precarização. É preciso compatibilizar inovação com direitos e segurança jurídica”, afirmou.

O ministro Luiz Marinho concordou, ressaltando que o país precisa optar entre a “modernidade com proteção” e a “oficialização da fraude como normalidade”. “O papel da Justiça do Trabalho é justamente o de analisar as relações legítimas e assegurar o cumprimento da Constituição. O que está em jogo é o futuro do trabalho no Brasil”, concluiu.

Fonte: GOV.BR

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