A natureza pública da delegação e o futuro do extrajudicial: reflexões na VIII CONCART

A VIII CONCART & XXV Congresso da ANOREG/BR realizou, em Brasília, um painel dedicado à discussão sobre a natureza pública da atividade Notarial e Registral, sua autonomia administrativa e os parâmetros constitucionais que regem a delegação no Brasil. A mesa reuniu a Registradora de Imóveis Ana Cristina Maia e o Ex-Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que examinaram a estrutura jurídica do modelo previsto no artigo 236 da Constituição Federal.

Na abertura, Ana Cristina contextualizou que a atividade Notarial e Registral é uma função estatal exercida por particulares mediante delegação, sujeita à fiscalização permanente do Poder Judiciário. Destacou que a autonomia administrativa e financeira não constitui benefício ou privilégio, mas ferramenta necessária para assegurar continuidade, eficiência e regularidade dos serviços prestados à população.

Segundo ela, “a autonomia de gestão não é um privilégio; é o que garante a execução adequada do serviço público que chega ao cidadão”.

A Registradora explicou que a Lei nº 8.935/94 estruturou o regime de delegação com mecanismos que permitem ao Delegatário organizar o funcionamento da Serventia, contratar equipes, realizar investimentos e implementar rotinas de atendimento. Ressaltou que essa autonomia está condicionada ao interesse público e não afasta deveres como cumprimento de horários, manutenção de estrutura adequada, observância de normas técnicas e atendimento contínuo, independentemente de interinidade. Chamou atenção para as limitações enfrentadas por interinos, especialmente no que se refere a investimentos em modernização tecnológica, e observou que “o usuário não distingue Delegatário de interino; ele apenas necessita do serviço”.

Em seguida, José Eduardo Cardozo apresentou análise estruturada sobre a posição jurídica do Extrajudicial no ordenamento brasileiro. Explicou que o serviço Notarial e Registral possui natureza estatal, ainda que seja exercido por particulares, e que essa configuração decorre de um modelo híbrido desenvolvido pelo constituinte de 1988. Afirmou que “o serviço Notarial e Registral no Brasil é uma atividade estatal exercida por particulares, mas essencialmente estatal”, ressaltando que isso o distingue de concessões de serviços públicos e de atividades privadas em cooperação com o Estado.

Cardozo recuperou elementos históricos da formação do Estado liberal e do Estado social para demonstrar a evolução das relações entre público e privado, destacando que a delegação do serviço Extrajudicial representa uma das formas contemporâneas de execução indireta de função pública. Defendeu que o modelo combina responsabilidades estatais, gestão privada e controle judicial, produzindo uma configuração que exige permanente diálogo institucional e rigor técnico na aplicação das normas. Em sua exposição, também alertou para a necessidade de fortalecimento da interlocução com a sociedade: “Quem não sabe dialogar com a sociedade perece”, observando que a falta de compreensão sobre a natureza da delegação favorece distorções de percepção e questionamentos inadequados sobre sua legitimidade.

O Ex-Ministro tratou ainda da importância de enfrentar preconceitos históricos dirigidos à atividade e enfatizou que o cumprimento rigoroso dos deveres funcionais é fundamental para preservar a credibilidade do sistema, evitando que infrações pontuais sejam interpretadas como características estruturais. Defendeu que o futuro da atividade depende da capacidade de modernização, do aprimoramento de práticas internas, da aproximação com universidades e da produção de conhecimento técnico que consolide o papel do Extrajudicial na administração pública.

Ao final, Ana Cristina agradeceu a participação e observou que os pontos apresentados reforçam a necessidade de continuidade da agenda institucional voltada à segurança jurídica e à melhoria dos serviços oferecidos. O painel foi encerrado com foco na afirmação do modelo constitucional brasileiro e na importância de sua correta compreensão para o fortalecimento da atividade.

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Primeiro dia (aqui)

Segundo dia (aqui)

Terceiro dia (aqui)

Fonte: ANOREG/BR

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