A cerimônia de encerramento da Conferência Nacional dos Cartórios, realizada no dia 2 de setembro, em Fortaleza, contou com a ilustre presença do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux. Finalizando dias de muito aprendizado e compartilhamento de conhecimento, Fux ministrou a palestra “Desjudicialização de atos notariais e registrais: diálogos com o Poder Judiciário”.
Em sua fala de abertura, o ministro expressou toda sua admiração por notários e registradores e ressaltou uma grande conquista, fruto da parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Ratificamos nossa promessa primária chancelando a escola notarial. Agora, cabe à categoria lutar por uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para inserir na composição do CNJ um membro representante dos notários e registradores, que muito auxiliaria na resolução de problemas”.
Para tratar de desjudicialização, a autoridade contextualizou que, há quase um decênio, surgiu a escola de pensamento jurídico, denominada Análise Econômica do Direito, que estabeleceu a necessidade do sistema de justiça incorporar um importante elemento da economia, a eficiência. O objetivo central dessa corrente é atribuir, tal como no sistema econômico, mais eficiência à justiça perante situações de desprovimento. “Esse ambiente de escassez no judiciário, ligado à ideia de judicialização predatória e litigiosidade desenfreada, é notório e a morosidade do sistema é um dos principais males contemporâneos”, afirmou.
Diferente de outras práticas jurídicas do contexto internacional, como a corte norte americana, o Direito brasileiro possui a cláusula constitucional da inafastabilidade do judiciário, que, uma vez incitado a se pronunciar, deve efetivamente dar a palavra, acolhendo todos os processos que sobre ele recaem. “Nós temos o dever constitucional de receber todas as demandas. Isso gera o abarrotamento dos tribunais. Por necessidade de eficiência e de se desafogar o judiciário, foram surgindo alguns fenômenos, como o juizado de pequenas causas, as cortes de conciliação e os juizados especiais, que mitigam a sobrecarga da justiça atual. Contudo, a prática mais moderna é a transferência da instância dos tribunais para a instância extrajudicial, buscando na atividade notarial meios mais céleres e eficientes para a resolução de problemas”, explicou.
Segundo o ministro, o primeiro benefício do meio extrajudicial para a população nacional é sua capilaridade, ou seja, o alcance dos cartórios, uma vez que são mais de 15 mil serventias atendendo cerca de 5 mil municípios, garantindo a acessibilidade social. “Por exemplo, mesmo as pessoas que moram nos lugares mais longínquos têm acesso a um Registro Civil, importante ferramenta para o exercício da cidadania. A desjudicialização é uma estratégia que faz com que haja uma justiça coexistencial, em que o judiciário tradicional e as atividades extrajudiciais trabalham juntos. E essa capilaridade cartorária é muito importante, também, para mitigar a sobrecarga dos tribunais, solucionando questões que antes só eram apreciadas pela justiça convencional, como separação, divórcios, inventário, partilha, alienação e execução de créditos e títulos extrajudiciais”.
Fux ainda ressaltou a credibilidade da atividade notarial: “Uma pesquisa do Instituto DataFolha verificou que dentre todas as instituições que gravitam em torno da justiça, os cartórios são a com maior prestígio junto à sociedade, acima do judiciário, ministério público e até das forças armadas.”, destacando, também, que os ofícios são uma atividade que coadjuvam e auxiliam de forma muito significativa para o bom funcionamento do sistema judicial. “O trabalho realizado por Cartórios de Protestos de Títulos, de Notas, de Registro de Imóveis, Registro Civil de Pessoas Jurídicas, entre outros, agilizam problemáticas, otimizam o relacionamento social, conciliam e mediam conflitos e favorecem o campo tributário”.
Para exemplificar sua afirmação, o ministro citou a partilha, um processo que leva anos na justiça, mas que é solucionado rapidamente por meio da atividade extrajudicial dos notários. “Outro exemplo é a usucapião. Nós apuramos no CNJ um caso que já se estendia por 30 anos sem que a parte contrária fosse ouvida. Hoje, nós podemos fazer uma ação de usucapião extrajudicial nos cartórios. Ali, em poucos meses, a questão se resolve, ouvindo todos os interessados, inclusive o Ministério Público”.
Fux ainda celebrou a parceria de mais de dois anos entre o Conselho Nacional de Justiça e a Confederação Nacional de Notários e Registradores (CNR). “Eu e Bacellar tivemos a oportunidade de fazer inúmeros acordos de cooperação, que têm acarretado em uma grande evolução para a atividade. A escola de notários, por exemplo, é um sonho que se tornou realidade. São novos tempos e precisamos de novos horizontes. Para enaltecer ainda mais a atividade notarial, cabe dizer que a diretiva europeia sobre os cartórios estabelece que o processo perante os tribunais está se tornando um sistema de último recurso, sendo utilizado somente quando as mais civilizadas e proporcionais técnicas falharem ou não puderem ser aplicadas ao caso. Ou seja, a diretiva consagra, com bastante ênfase, a atividade notarial. Nós estamos servindo a uma outra época, e o Direito, como instrumento da vida e da esperança, está passando por mudanças. Então, parabéns a todos os senhores”, finalizou.
Antes de iniciar o Jantar de Encerramento da Concart 2022, o presidente da CNR, Rogério Portugal Bacellar, subiu ao palco cerimonial para homenagear o ministro por seus 40 anos de magistratura, em um momento emocionante.