Compliance Tributário e os Reflexos da Atividade Notarial e Registral são destaques na VIII CONCART

A VIII CONCART & XXV Congresso da ANOREG/BR que acontece em Brasília (DF) promoveu na manhã desta quarta-feira (26) um importante painel para analisar como o avanço do compliance tributário impacta diretamente a atividade Notarial e Registral. Sob a mediação do tributarista Maurício Zockun, o painel abordou os desafios do setor frente às exigências fiscais contemporâneas, o papel das Corregedorias e da Receita Federal, e as profundas consequências da reforma tributária sobre a atuação das Serventias Extrajudiciais.

Logo na abertura, Zockun destacou como os Cartórios vivem um ambiente regulatório complexo, submetidos simultaneamente a comandos nacionais — via CNJ — e a normas locais de cada Tribunal de Justiça. Essa multiplicidade exige, segundo ele, uma postura cada vez mais estruturada de conformidade, a fim de evitar riscos decorrentes de interpretações divergentes entre órgãos fiscalizadores.

A palavra então foi passada a Alessandro Martins, auditor da Receita Federal e integrante do grupo de trabalho nacional responsável pelo desenvolvimento do Livro Caixa Digital dos Cartórios, que apresentou, de forma didática e transparente, o estágio atual do projeto que unificará o Livro Caixa fiscal — de interesse da Receita — e o Livro Diário Auxiliar — de interesse das corregedorias — em um único arquivo digital, capaz de atender simultaneamente às duas esferas de controle.

Segundo o auditor, o objetivo não é aumentar a fiscalização, e sim reduzir a presença física do auditor, modernizar a relação fisco-contribuinte e facilitar a vida dos Delegatários. O novo sistema deverá importar automaticamente receitas e despesas, cruzar dados com os TJs e gerar relatórios gerenciais que auxiliarão tanto os cartórios quanto o próprio Estado a operar com maior previsibilidade.

Martins reforçou que o projeto nasce inserido em um movimento global, conhecido como Administração Tributária 3.0, que privilegia orientação, conformidade e automatização. Citou ainda que o manual de orientações — em fases finais de revisão — já reúne mais de 140 páginas com interpretações atualizadas da Receita, jurisprudência do CARF, decisões do STF e do STJ, além de detalhamento das despesas dedutíveis e não dedutíveis, um tema historicamente sensível para as serventias.

Em seguida, o tributarista e contador Evandro Oliveira trouxe uma das exposições mais enfáticas do painel, conduzindo os presentes a uma analogia histórica com a administração de José, no Egito, para ilustrar como tributos temporários frequentemente se tornam permanentes e opressores quando não há mecanismos de controle e participação ativa do contribuinte. Evandro demonstrou, com números concretos, o impacto da retenção na fonte do Imposto de Renda sobre os CRVAs do Rio Grande do Sul — que, sem a possibilidade de uso do livro-caixa, podem sofrer perdas milionárias ao longo de poucos anos.

O especialista também criticou a interpretação de que o ressarcimento de atos gratuitos configure aumento de renda para fins tributários, o que gera distorções ao ponto de Cartórios serem autuados por ISS sobre serviços em que não há preço. Para ele, o setor vive “contradições tributárias insustentáveis”, como a tributação de valores não disponíveis ao Delegatário — caso, por exemplo, de depósitos pré-recolhidos para repasse a fundos ou órgãos públicos.

A apresentação foi encerrada com um apelo: que o setor se una para superar o “Egito tributário” descrito por ele e conquistar maior justiça fiscal, especialmente em meio ao cenário de reforma tributária.

Por fim, o advogado e professor Felipe Fleury trouxe a perspectiva europeia para explicar os efeitos práticos da implementação do IVA dual (CBS + IBS) sobre os Cartórios. Habituado à lógica do IVA português, Fleury ressaltou que a atividade Notarial ingressará em um sistema com alíquotas que podem chegar a 28%, substituindo um ISS médio de 5%. Para ele, as maiores preocupações do setor devem ser: o impacto imediato das obrigações acessórias que começam já em 2026; a necessidade de adaptação tecnológica para emissão de notas fiscais com destaque de tributos; o risco de que CBS e IBS incidam sobre o valor bruto dos documentos, e não apenas sobre os emolumentos; a responsabilidade solidária dos Cartórios em operações imobiliárias; e o impacto do split payment e da não cumulatividade, que exigirá rigor contábil diário.

Fleury ainda alertou para a recém-aprovada tributação mínima do IRPF, que poderá elevar dramaticamente a carga sobre Delegatários que ultrapassem rendimentos anuais de R$ 600 mil — mesmo quando suas despesas de operação forem altas. Ele classificou a medida como “confiscatória”, pois transforma imposto de renda em imposto sobre receita, ferindo a lógica do livro-caixa e inviabilizando investimentos.

Ao encerrar, Zockun resumiu o clima do painel: a modernização tributária é inevitável, mas sem ajustes, “a renda não será mais tributada — será o patrimônio”. O desafio agora será construir, em conjunto, soluções que preservem o equilíbrio econômico-financeiro do serviço extrajudicial e garantam que a segurança jurídica continue sendo o pilar da atividade.

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Primeiro dia (aqui)

Segundo dia (aqui)

Terceiro dia (aqui)

Fonte: ANOREG/BR

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